domingo, 10 de julho de 2011

Teoria comportamental


No  ano  de  2010  assumi  uma  sala  de quinto  ano,  no  segundo  trimestre, e  vivi  uma  situação  singular, a  ponto  de  em  poucos dias  renuncia-la.
Foram  três  dias  de   seleção, com dinâmica, prova  escrita  e entrevista. Durante  o  processo conheci algumas professoras  e  fomos avaliando  aqueles  que  nos  avaliavam.
Observamos  que  existe  um  modismo  na  forma  de  seleção,  que já tornou-se padrão, e  que  infelizmente  não  colabora  muito  para  definir  realmente  as  competências e  habilidades  dos  candidatos.
Mas  mesmo  assim  resolvemos  ir  até  o  final,  eram  cinco  vagas  para  trinta  concorrentes  e  fui  uma  das  selecionadas.

Ao assumir,  a  direção  e coordenação  explicaram que  estavam  apostando  todas  as  fichas  em  mim,  que seria  a salvação  daquela  turma,  era  o  sol  no  horizonte  para  elas,  então situaram-me em relação a turma  e  imediatamente  fiquei preocupada.
Eles estavam  juntos  desde o  maternal, muitos  em  período  integral  e  tinham  uma  cumplicidade grande, eram  indomáveis, tinham  o  controle  nas  aulas,  faziam  o  que  queriam,  estavam  com  baixo  rendimento e necessitando  de  uma mão  dura, alguém  que os enfrentasse, revertesse  a situação,  colocasse  ordem  na  sala.
De antemão  coloquei  minha  forma  de  trabalhar, sondaria  as  expectativas  deles,  sua responsabilidade na  aprendizagem, como  gostariam  de aprender, o  que  os incomodava durante as  aulas, construia  com  eles os  limites/regras,  combinaríamos  uma  rotina, dividiria  a  turma  em  oito  grupos  e estabeleceria  metas para  alcançar,  sendo  que os  grupos  deveriam  cooperar  entre si,  pois  as  metas  eram  do  conjunto.
A coordenação ficou  animada  e  até  sugeriu  que  combinasse  um  passeio  se  eles  melhorassem  o  rendimento  no  próximo  trimestre.

Então  agora  era  só  mãos  a  obra. Iniciei  numa  terça-feira.
A professora  que  sairia  de licença  ficou  três  dias  comigo e  falou-me  da  situação difícil  da  turma.
Nesses  três  dias  vi  de  tudo,  aluno  pulando  sobre  as  carteiras, brigando, jogando  estojos nos outros  e  pro  alto, fugindo pro corredor, rasgando  livros, quebrando  lápis, empurrando, dando  rasteira  e  a  professora  gritando,  dando  sermões,  se escabelando, discutindo, tratando os  alunos  com  indiferença  e  impaciência.
A  sugestão  dela  era  ser  firme,  encarar  de  peito, impor  respeito,  ser  dura  e  muito  autoritária.
Voltei  à coordenação, falei o  que  observára  e que  não  era  meu  perfil  ser  autoritária  e  sim  exercer  a  autoridade, que os  alunos estavam viciados  naquela  atitude  e  da  dificuldade  em  executar  meu  planejamento sem alguma  ajuda.

Retornei  do  final  de semana  e  a  coordenadora  me ofereceu  uma  auxiliar, pois  tinha  muita  prova  para ser  refeita  e  livros  sem  correção.
Tentei  sem  sucesso  conversar  com  eles,  me  davam  as costas  e  ficavam  jogando baralho, joguinhos no  celular  ou  conversando  em  rodinha.
A auxiliar deu  uns  berros e  então  consegui  dar  início  ao  meu  planejamento. Conversei meia hora  e  logo  veio aula com  outro  professor,  intervalo  e  recomecei  tudo  denovo, sem sucesso.
Voltei  pra  casa  com a  cabeça  explodindo,  muito  barulho  e  pouco  resultado.
Assim  foram  mais  quatro  dias,  sensação  de perda  de tempo  e  frustração.

Iniciei a semana  e conversei  com  a coordenação, tinha  avançado  pouco e  pensava  em  fazer  uma  reunião  com  os  pais  para  entender  como  lidavam  com  os  filhos  em  casa  e  combinar  estratégias  para  melhorarem  o  comportamento. Também enviaria  para  coordenação  os  alunos  que  tivesem  comportamento  impróprio  para  levarem  uma  advertência.
Pediu-me até  o  final do  dia  para uma resposta.
Decidiram  então  que  era  melhor não  incomodar os  pais, pois  afinal eles  chegavam  cansados  do  trabalho  e  era  função  da escola  resolver  assuntos  disciplinares e  que  poderia  enviar  os  alunos  que  achasse  necessário  para  coordenação, não  para  tomarem  advertência, e  sim  para  conversarem.

Retornei  dia  seguinte,  pedi  para  auxiliar  passar  uma atividade  na  lousa  e fiquei  corrigindo  provas  e os trabalhos de  reposição  de  nota.
Percebi  que  com  dois  berros e  ameaças  de  mandar  para  direção  eles  ficaram sentados  e  até  participaram  da  atividade.

Não  tive  dúvida,  levantei  e  fui  até  a sala  da  direção,  expliquei  que  a  professora que  procuravam  estava  dentro  da  escola  há  quatro  anos, e  aquela  turma  funcionava  muito  bem  com  ela.
Comentei  que  ela  era  bem  alta  e  forte,  com  voz  estridente  e  impunha  respeito,  e  eu  além  de  tudo  era  menor  que  eles.
A  diretora  argumentou  que  a  auxiliar  não  estava  formada em  pedagogia  e  não  podia assumir.
Então  retruquei que  era  uma  pena, porque era  autoritária  e  funcionava, e  eu  infelizmente não  iria  faze-lo  igual.
Até  o  final  da semana  a  direção pensou  e  concordou  comigo,  agradeceram  minha  franqueza e  me  liberaram.
Durante  dias  fiquei  pensando  em  tudo  que vivera, na  seleção, no perfil  da  turma,  na atitude  da  escola, no  meu  desempenho  e no  desfecho.
Me aborrecia  o  fato de  não  ter  domado  aquela  turma,  assim  tive  uma clareza  sobre  os fatos.

Então  pontuei,  primeiro domar  não  é  coisa  para  uma  sala de aula, pois  lá  não  estão animais irracionais.
Segundo, os  alunos  assim  estavam  por  falta  de  atitude  dos  pais  e escola.
Terceiro,  o comportamento  deles é  reflexo  de uma  educação  desconexa,  descontextualizada, sucateada  e  perigosa.
Quarto,  esses  perfis  sem  limite  é  que  saem  pondo  fogo  em  indigentes e coisas similares.
Quinto, minha formação valoriza a  transformação  de  atitude  pelo auto-conhecimento, pela auto-regulação pessoal, pelo  empenho e  responsabilidade  para  atingir  um  resultado  satisfatório.
Sexto, acredito  na  construção  da  educação com parceria  familiar, sem  o  qual é inviável  a  caminhada.
E  por  último  a  relação  com  meus  alunos sempre será  de  autoridade,  pois  o  afeto  permeia  minha  prática  e o  respeito  mútuo fortalece  a  aprendizagem.
Amo  o que  faço  e  faço  por  que acredito,  tanto  que  não  sei, nem  quero  um fazer  diferente.

Teoria comportamental
Lembrei-me  de  Watson  e  Skinner, que através de estímulos, reações e hábitos,   obtinham  a  aprendizagem  com  ratos  em  laboratórios.
Uma  escola que  estimula  errado, tem  reações contrárias, hábitos  incorretos  e  a  aprendizagem  é  errada.
Infelizmente  quando  tratamos  crianças  como  cobaias  esse resultado  é  obtido.
Essa  teoria  está  obsoleta para  aprendizagem,  mas  serviu  para  explicar como  essa  turma  chegou  nesse estágio,  uma verdadeira  pena!

Magda  Cunha

*Pedagoga, Psicopedagoga, Especialista em prendizagem,
  consultora na rede pública e particular de ensino.
mailto:ensino.mag-helen.maravilha@gmail.com | http://www.promaravilha.blogspot.com/

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