Oralidade não se aprende por intuição: gêneros mais formais, como o seminário, devem ser trabalhados com as crianças desde as séries iniciais
Fonte: Revista Nova Escola
Autor: RR / Rodrigo Ratier
Por alguns instantes, volte ao passado: algum professor ajudou você a saber como falar?
Salto para o presente: na sua prática em sala, você se preocupa em abordar conteúdos da oralidade?
É possível que a resposta às duas perguntas seja a mesma: um sonoro "não".
Montagem sobre foto: Edson Reis
Consulte mais sobre o tema pela internete e faça o download da obra As Práticas Orais na Escola, de Cláudia Goulart neste site:
http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=vtls000374639 , segue o resumo dele abaixo.
Resumo:
Este trabalho tem como foco de estudo as práticas orais na escola de
Ensino Fundamental, mais especificamente, a atividade de seminário e o
gênero exposição oral nas aulas de Língua Portuguesa. A motivação para
esta pesquisa surgiu ao longo de nossa trajetória como professora de
Língua Portuguesa, em escolas públicas, ao observarmos a falta de
planejamento e de sistematização das atividades relacionadas à exposição
oral na escola, especialmente em atividades como seminários. Começamos,
então, a observar em que momentos privilegiava-se o trabalho com esse
gênero e verificamos que, na esfera escolar, o espaço dedicado ao
desenvolvimento das competências linguística, textual e comunicativa
apropriadas ao domínio do expor era restrito, limitado a atividades como
leituras em voz alta e discussões informais sobre temas relacionados
aos conteúdos das diversas disciplinas. Percebemos, neste trabalho, que o
processo de reflexão sobre a tomada da palavra publicamente pelos
alunos como locutores ? e não apenas como interlocutores nas diversas
práticas sociais ? é ainda pouco considerado pela escola e pelo sistema
educacional como um todo, porque a prática da exposição oral em
seminário não é concebida como um locus que demande reflexão,
sistematização e avaliação didática por parte do professor de língua e
dos alunos. Isso acontece, provavelmente, devido à antiga tradição de
ensino e aprendizagem de língua materna, em que a leitura e a produção
de textos escritos eram ? e ainda são ? consideradas as principais
atividades necessárias para o desenvolvimento das competências
linguística e comunicativa dos alunos. Essas reflexões nos possibilitam
formular a hipótese de que a exposição oral é um instrumento importante
e necessário na escola, porque funciona como um mediador fundamental no
desenvolvimento de habilidades de leitura, escrita e produção de fala
em contextos formais dentro e fora da escola. Embora os aprendizes
passem, em média, oito anos no Ensino Fundamental, a maioria deles -
apesar de estar ao longo do processo escolar produzindo a exposição oral
em seminários ou debates - não demonstra ter desenvolvido, ao final
desse nível, uma competência em relação a esse gênero. A abordagem
teórico metodológica que sustenta a nossa análise está inscrita na
sociolinguística interacional, especialmente o conceito de enquadre
comunicativo e no sócio interacionismo, sobretudo aquele empreendido pelo
Grupo de Genebra, e nas discussões sobre interação, comunicação e
práticas de linguagem, na perspectiva de Vion (1992), Bronckart (1997),
Dolz & Schneuwly (1996) e Schneuwly & Dolz (1997). Esses
conceitos são especialmente importantes quando se trata de estudar as
ações de linguagem realizadas por sujeitos inscritos dentro de um quadro
social mais amplo e mediadas por uma situação comunicativa específica.
Ainda neste estudo, é nosso objetivo examinar como os alunos mobilizam
os elementos não verbais (paralingüísticos e cinésicos) e prosódicos no
curso das apresentações de seminário. Esses elementos são essenciais
quando se estudam as práticas de linguagem oral, dada sua natureza
multimodal. Constatamos, nas análises, que as aulas de Língua Portuguesa
não são planejadas com a intenção de desenvolver habilidades
relacionadas ao exercício da exposição oral. Por isso, na primeira
apresentação de seminário por parte dos alunos, foram constatados três
tipos de enquadres comunicativos. O primeiro deles, o Enquadre A,
reflete a forma mais comum de realização de seminários na escola hoje, a
saber, a leitura em voz alta dos textos resultantes da pesquisa, sem a
exploração de outros recursos, tais como o contato visual com a plateia,
introdução e fechamento, gestualidade apropriada, texto expositivo que
consiga prender a atenção da plateia. O Enquadre B também consistiu de
leitura do material escrito da pesquisa, no entanto, apresentou
características um pouco diferenciadas, porque os alunos enunciaram
textos de introdução e/ou de conclusão, porque houve a mobilização de
recursos gestuais e porque houve uma interação mais direta com a
audiência por meio do olhar e da expressão facial. Apesar de alguns
alunos olharem timidamente para a plateia (na maioria das vezes,
desviando os olhos dos colegas), o contato visual com a audiência
aconteceu mais vezes do que nas apresentações do enquadre A. O terceiro
enquadre (Enquadre C) ? muito diferenciado dos dois anteriores ? foi
produzido por um número restrito de alunas (03 dos 41 alunos), que
tentaram assumir o ethos de expositoras, mobilizando a atenção e a
participação da plateia para a qual elas estavam expondo. Houve presença
de falas de conclusão, as falas foram mais fluentes, com o uso do texto
escrito como apoio. As alunas desse enquadre usaram recursos
paralingüísticos (risos) para captar a atenção da plateia, recursos
cinésicos (gestualidade e olhar) e recursos prosódicos (tom de voz,
altura e boa qualidade de voz) de forma mais consciente.
No segundo momento, após as intervenções, verificamos que os alunos
mobilizaram com mais naturalidade os recursos não verbais e prosódicos
para travar uma interação mais efetiva com a plateia. As principais
diferenças entre este momento e o anterior são: (i) a seleção dos
conteúdos efetuada pelos alunos consegue produzir uma exposição sobre o
tema escolhido com um sentido global. (ii) a emergência dos papéis
sociais do expositor e da plateia; (iii) a estruturação composicional da
exposição oral, que revela uma progressão textual mais adequada,
resultando um número bem menor de incoerências locais. Com isso, fica
evidenciado o papel central que as intervenções didáticas e as
discussões avaliativas podem ter na construção de uma mudança
significativa das práticas de linguagem oral na escola
Uma apresentação de sucesso
ROTEIRO PRECISO
Uma cola com tópicos pode ajudar a encaminhar a apresentação. Não vale ler os cartazes nem decorar o trabalho
DISCURSO SEGURO
As falas devem ser claras, coerentes e concisas: é preciso passar todo o conhecimento no tempo combinado
APOIO CERTEIRO
Recursos visuais devem trazer informações simples e diretas para facilitar a compreensão do tema geral da apresentação
Uma cola com tópicos pode ajudar a encaminhar a apresentação. Não vale ler os cartazes nem decorar o trabalho
DISCURSO SEGURO
As falas devem ser claras, coerentes e concisas: é preciso passar todo o conhecimento no tempo combinado
APOIO CERTEIRO
Recursos visuais devem trazer informações simples e diretas para facilitar a compreensão do tema geral da apresentação
A razão é compreensível. Existe a ideia corrente de que não é papel da escola ensinar o aluno a falar - afinal, isso é algo que a criança aprende muito antes, principalmente com a família. Meia verdade. Há nessa concepção um erro grave de reduzir a oralidade à fala cotidiana, informal, representada pelos bate-papos e pelas conversas do dia a dia. O fato é que, sob a denominação genérica de "linguagem oral", encontram-se diversos gêneros: entrevistas, debates, exposições, diálogos com autoridades e dramatizações. Em relação a todos eles, o professor tem um papel importante.
"Cabe à escola ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral nas diversas situações comunicativas, especialmente nas mais formais", afirmou o psicólogo suíço Bernard Schneuwly em entrevista à NOVA ESCOLA em 2002. Considerado um dos maiores estudiosos sobre o Desenvolvimento da oralidade, ele defende que os gêneros da fala têm aplicação direta em vários campos da vida social - o do trabalho, o das relações interpessoais e o da política, por exemplo.
Esforço contínuo
Uma
primeira medida para resgatar a importância do tema é investir na
abordagem sistemática. A estratégia que deve permear todas as fases da
escolarização é iniciar o trabalho pelas situações comunicativas
praticadas naturalmente em sala de aula. Partindo dessa perspectiva, o
Centro Educacional São Camilo, em Cachoeiro de Itapemirim, a 130
quilômetros de Vitória, decidiu trabalhar o seminário como uma atividade
permanente desde o início do Ensino Fundamental (veja a foto à
esquerda). E não apenas nas aulas de Língua Portuguesa: pesquisas e
trabalhos de campo de História, Geografia e Ciências, antes restritos à
entrega em papel, são apresentados para toda a turma na forma de
exposição oral. "Com a experiência constante, os estudantes avançam em
todas as etapas do trabalho: passam a fazer pesquisas mais profundas,
descobrem o que pode ser utilizado na apresentação e mostram mais
desenvoltura na hora de expor o assunto", diz a coordenadora pedagógica
Edna Valory (leia no quadro acima os conteúdos desse tipo de atividade).
No seminário, como em qualquer outro gênero, o fundamental é conseguir que ele faça sentido aos alunos. Para isso, o professor deve debater com a turma o propósito da atividade: por que estamos fazendo essa pesquisa? Quais os critérios para selecionar o que aprendemos e merece ser apresentado? De que forma ele pode interessar ao público? "O seminário tem de ter uma finalidade maior do que ser apenas uma apresentação. Caso contrário, o trabalho corre o risco de se tornar desmotivante", explica Roxane Rojo, professora do Departamento de Lingüística Aplicada da Universidade de Campinas. Depois, é partir para o detalhamento dos procedimentos que sustentam a apresentação oral (leia sequência didática com etapas da atividade ao lado).
A melhor forma de conseguir bons resultados é acompanhar o aluno em todos os processos. No Colégio Sete de Setembro, em Fortaleza, a orientação dos seminários vai desde a discussão sobre o tema até a avaliação da apresentação. "No momento em que o aluno vai pesquisar, por exemplo, não adianta ele reunir um monte de indicações bibliográficas ou simplesmente copiar trechos de sites da internet. É tarefa do professor auxiliar na seleção de informações e na articulação das diversas fontes", explica a coordenadora pedagógica Rachel Ângela Rodrigues.
Ainda que a exposição oral seja mais comum nas séries finais do Ensino Fundamental, ela pode ter lugar desde os primeiros anos. A recomendação dos Parâmetros Curriculares Nacionais é que as expectativas de aprendizagem acompanhem a evolução dos alunos. A partir do 3º ano, é possível exigir mais formalidade no uso da linguagem, preparação prévia e manutenção de um ponto de vista na apresentação. A avaliação deve contemplar esses aspectos - desde, claro, que o professor os tenha ensinado.
O que ensinar nos seminários
Quem
disse que uma apresentação se aprende espontaneamente? Um seminário
possui uma série de procedimentos formais que devem ser abordados em
sala. Primeiro, é preciso estudar a fundo o assunto a ser apresentado
por meio de pesquisas e leituras. Em seguida, é necessário triar as
informações e preparar a exposição, estruturando-a para que ela seja
assimilada pelos colegas. Só então chega o momento de partir para a
apresentacão propriamente dita. Nessas etapas, há quatro aspectos que
não podem ser esquecidos:
- Planejamento do texto: além de cuidar do conteúdo (uma preocupação comum a todas a situações comunicativas), um seminário exige a preocupação com a forma como as informações são passadas, que não pode ser a mesma usada com os colegas no dia a dia. Por isso, é necessário trabalhar as diferenças entre a língua formal e a informal
- Estrutura da exposição: o conteúdo precisa ser apresentado de forma clara e coerente - o objetivo é facilitar a compreensão de seu sentido geral. Para que isso ocorra, o texto oral deve ter uma sequência organizada: fase de abertura, introdução ao tema, desenvolvimento, conclusão e encerramento.
- Características da fala: o tom e a intensidade da voz do expositor devem criar um clima propício para a interação com a plateia.
- Postura corporal: olhares, gestos, expressões faciais e movimentos corporais são importantes para complementar as informações transmitidas pela fala. Esses recursos auxiliam a mobilizar a escuta atenta.
- Planejamento do texto: além de cuidar do conteúdo (uma preocupação comum a todas a situações comunicativas), um seminário exige a preocupação com a forma como as informações são passadas, que não pode ser a mesma usada com os colegas no dia a dia. Por isso, é necessário trabalhar as diferenças entre a língua formal e a informal
- Estrutura da exposição: o conteúdo precisa ser apresentado de forma clara e coerente - o objetivo é facilitar a compreensão de seu sentido geral. Para que isso ocorra, o texto oral deve ter uma sequência organizada: fase de abertura, introdução ao tema, desenvolvimento, conclusão e encerramento.
- Características da fala: o tom e a intensidade da voz do expositor devem criar um clima propício para a interação com a plateia.
- Postura corporal: olhares, gestos, expressões faciais e movimentos corporais são importantes para complementar as informações transmitidas pela fala. Esses recursos auxiliam a mobilizar a escuta atenta.
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