A criança se expressa de muitas formas, o brincar privilegia todas elas...
As 100 linguagens das crianças
Fonte: Portal prendiz
Por Patrícia Gomes, do Porvir
Reggio Emilia, abordagem criada no pós-guerra em cidade
italiana, leva aprendizado por projetos na educação infantil.
Não sobrou pedra sob pedra na cidade italiana de Reggio
Emilia depois da segunda guerra mundial: ruas, escolas, casas… Tudo havia sido
bombardeado. Para não privar os filhos do direito de estudar, um grupo de pais
se organizou, reuniu material dos escombros, conseguiu um terreno e construiu
uma escola. Um jovem que passava de bicicleta gostou do que viu e resolveu
ficar. Loris Malaguzzi criaria ali, em 1946, naquele ambiente marcado pela
destruição, uma forma de trabalhar o ensino infantil que viria influenciar
escolas do mundo inteiro, inclusive no Brasil, que estimula crianças a usarem
todas as suas maneiras de expressão, leva a produção dos pequenos para fora da
escola e traz a comunidade para dentro.
“A criança tem milhões de linguagens. Quando ela chega na
escola, normalmente são privilegiadas as dimensões escrita e oral. Mas as
crianças podem se expressar de diversas outras formas”, diz Paola Capraro,
diretora da escola bilíngue Eugenio Montale, que fica em São Paulo e usa a
abordagem. E por apostar em todas as linguagens com as quais as crianças se
comunicam, preceito muito defendido pelo fundador Malaguzzi, o sistema reggiano
vê a criança como um ser forte, pensante, com visão própria de mundo.
Ao contrário do que ocorre no ensino tradicional, as crianças
não se juntam por idade, mas por interesses. Um grupo pode ter, por exemplo,
alunos de três a seis anos que se unem para trabalhar juntos em um projeto, que
pode ser entender como uma ponte funciona. Enquanto uma equipe vai pesquisar
quais são as pontes mais importantes do mundo, outra decide que vai construir
um protótipo de argila e outra trabalha com figuras geométricas. Ao fim, as
equipes voltam a se reunir, contam o que descobriram e se aprofundam em
assuntos que julgarem importantes. Os aprendizados vão incluir as disciplinas
tradicionais, como matemática, história, geografia, e outras capacidades, como
capacidade de trabalhar em equipe, habilidades manuais e persistência.
“O mundo não é separado por áreas como a escola. No projeto,
todas as matérias são discutidas diante da realidade como ela é”, diz Paola.
Nesse ponto, ter um grupo heterogêneo quanto à idade também ajuda. “Como
acreditamos que todo mundo pode aprender com todo mundo, essa questão da idade
cai por terra”, afirma. Dessa forma, diz a diretora, o aprendizado é uma via de
mão dupla: a criança menor aprende com a maior porque tem menos experiência de
vida; a maior, ao ajudar a menor, precisa refletir e reorganizar o conhecimento
que tem; maiores e menores aprendem juntas a respeitar as diferentes opiniões
e, assim, vão se acostumando com conceitos como tolerância, paciência,
democracia e empatia.
Segundo a abordagem Reggiana, os grupos de crianças devem
ser acompanhados por uma equipe multidisciplinar, capaz de trabalhar com as
diferentes linguagens que a criança pode desenvolver. Até por isso, normalmente
um profissional ligado às artes, chamado na Itália de atelierista, acompanha os
trabalhos. Essa vocação é tão forte que, agora mesmo, quem visita Reggio Emilia
encontra parte da ciclovia da cidade e a cortina do teatro municipal enfeitadas
com desenhos feitos por crianças das escolas locais, o que reforça o vínculo
com a comunidade, outra característica determinante da abordagem.
“Essa relação direta [entre escola e comunidade] se dá pelos
eventos que são organizados na cidade em diálogo com a escola, pela criação de
um centro de formação de educadores que também atende a comunidade e pela
existência de um centro de materiais reciclados que abastece os ateliês das
escolas”, diz Nana Giovedi, diretora de educação infantil do Colégio Oswald de
Andrade, que visitou a cidade com uma a Rede Solare, um grupo da América Latina
que estuda a abordagem Reggiana.
Nenhum comentário:
Postar um comentário