Bruno Daniel Marzano de Almeida
Este post eu vivi literalmente
Aos vinte e cinco anos de idade em 1990 tive meu terceiro filho. Ele teve uma complicação nos primeiros dias após o parto, que culminou em sequela cerebral e foi necessário uma correção cirúrgica cardíaca.
Com perda de um terço do cérebro na região ocpital, e mais um poro encefalo do lado temporal direito, a perspectiva era quase nada de visão e hemeplegia (paralisia) do lado esquerdo.
Foi muito difícil ouvir o diagnóstico de pc (paralisia cerebral), mas com a força de Deus e apoio de minha mãe, consegui conciliar a maternidade dos três filhos e encontrar os caminhos para o tratamentos desde que ele obteve alta hospitalar, por volta dos três meses.
O tratamento iniciou aos quatro dias no Hospital das Clínicas setor cardíaco, aos três meses recebeu alta e foi encaminhado para a neurologia setor da estimulação precoce, concomitantemente foi atendido na Santa Casa de Misericórdia no setor da visão subnormal, pela Drª Silvia Vaez e Drª Amarilda Bruno, que prescreveram lentes convergentes pra estimular sua visão.
Do nono até uma ano e meio ganhou uma bolsa na escola Jaty Maternal e Jardim especializada em deficientes neurológicos, do Sr. Cutrale, o "rei" do suco de laranja do Brasil, através do pedido do meu cunhado que era seu funcionário direto. Utilizou aparelho nas pernas durante o dia para retardar a marcha e estimular o equilíbrio. Passou a ser atendido no Laramara para estimulação de visão e equilíbrio, clínica rescém inaugurado pelas Drª Silvia Vaez e Drª Amarilda Bruno. Deixou de usar óculos no final desta fase.
Dos dezenove meses até quatro anos foi atendido pela AACD e UNICID na reabilitação, com hidroterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia , psicologia e psicomotricidade, continuou no Laramara. Iniciou a marcha aos dois anos com botas adaptadas pra seu melhor desempenho e escolaridade para socialização aos três anos, em escola particular. Aos quatro anos foi pra EMEI. Passou usar ortese no braço esquerdo.
Dos cinco aos nove anos teve os atendimentos domiciliares de fono e psicomotricidade, fisioterapia no consultório. Acompanhamento visual em médico particular, com encaminhamento do Laramara. Realizou sua segunda cirurgia cardíaca no final desse ano. Dos cinco em diante cursou escolas particulares regulares, com número reduzido de crianças. Manteve o uso da ortese na mão esquerda, calçados ortopédicos, todo material escolar adaptado, como livros ampliados, prancha inclinada pra auxiliar na reflexão da luz, lápis de grafite macia e todo tipo de apoio pro seu desenvolvimento cognitivo.
Dos dez aos quinze anos praticou exercícios em casa com supervisão semanal, além de equipe multifuncional tendo condutor para baixa visão, psicologa, fono e fisioterapia em consultório e oftalmo, todos particulares. Aos dez anos operou o braço esquerdo pra corrigir desvio lunar e iniciou uso de aparelho ortodôntico. Aos quinze anos ingressou no sistema público de ensino, no curso médio regular. Manteve o uso da ortese no pós cirúrgico. Iniciou a compensação com palmilha em sapatos comuns e retirou o aparelho ortodôntico.
A partir dos dezesseis anos estava com sua reabilitação completa, bastava alongamentos diários, o uso de aparelho ortopédico superior foi suspenso, manteve a palmilha de compensação. Seguiu com consultas regulares ao neurologista, ortopedista, cardiologista e oftalmologista. Realizou sua terceira cirurgia cardíaca no final desse ano.
Aos dezoito anos ingressou na FATEC de São Caetano, vaga pra deficiente, precisou de ledor no vestibular. Porém a escola não estava preparada pra atender as diferenças, não tem currículo adaptado, nem professores treinados e isso inviabilizou seu percurso. Desistiu depois de ficar três semestres em dependência da disciplina matemática I, sempre por um ou meio ponto da média oficial.
Aos vinte anos iniciou seleção pra trabalho com vaga pra deficiente pela Agência Ame, foi aprovado no Banco Santander, e está muito bem integrado, na função de Assistente Administrativo até o hoje. Voltou a utilizar a ortese por encurtamento do tendão do braço esquerdo.
Aos vinte e um anos iniciou Designer Gráfico na Unip, a segunda faculdade também não tem professores preparados, ou mesmo currículos alternativos, e até o presente momento ele vem lutando pra conseguir ser atendido em suas necessidades.
Hoje aos vinte e três anos é portador de hemeparisia (só membro superior com função diminuída), usa aparelho para ajudar a função da mão, palmilhas pra compensação, tem perda de cinquenta-direito / esquerdo - setenta por cento de lateralidade na visão, acompanha com oftalmo, neuro e cardiologista.
Meu filho nasceu no momento da transição na educação especial, isso foi bom, pois me deu argumentos pra enfrentar barreiras e poder mante-lo em classe regular, de ter oportunidade de socialização e total aproveitamento de suas capacidades e habilidades.
Não foi um caminho fácil, sofreu bulling dos amigos, falta de preparo dos professores e preconceito das escolas por parte da coordenação e direção escolar, que viam em minhas reivindicações uma exceção à regra e por conseguinte prejuízo aos demais alunos.
Certamente encontrou almas boas e generosas, amigos que expressaram total envolvimento, como na EMEI seu amiguinho William fazia conchinha no bebedouro pra ele conseguir beber água, o empurrava na balança e o ensinou a não temer a gangorra e escorregador. No ensino fundamental a amiga Bia Mazarope o auxiliava na cópia das lições e emprestava material pra trazer pra casa, e o tratava com cuidado especial espontaneamente. No ensino médio teve uma coordenação e professores melhores adaptados à inclusão e conseguiu concluí-lo com auxilio de professores particulares. Na FATEC teve o amigo Alan, seu braço direito.
Mas nada dissuadiu Bruno, continua tentando encontrar seu lugar ao sol, é forte, persistente, sensível, afetivo, solidário e amoroso.
Tudo que fizemos valeu, sinto que ele tem condições de manter-se financeiramente, constituir uma família e suas diferenças estão completamente adaptadas à sociedade.
Espero nessa trajetória ter sensibilizado aos pais e equipe docente, ter provocado reflexão e alterado a perspectiva da inclusão.
A mim certamente mudou, para melhor auxilia-lo fiz o curso Técnico Magistério, após Pedagogia e por fim a Especialização em Psicopedagogia.
Esse blog é fruto dessa experiência e sinto que tenho contribuído na divulgação da inclusão e instrumentos pra trilhar esse caminho com entusiasmo, amor e esperança.
Magda Cunha
A seguir uma publicação do blog Educadora Especial.
Crianças Especiais - Cuidados Ortopédicos na Paralisia Cerebral
O diagnóstico de paralisia cerebral é muito preocupante para a família. Ao contrário do que muitos pensam, não há completa ausência das funções cerebrais, o cérebro não está paralisado - a nomenclatura que é inadequada.
Trata-se de uma lesão no cérebro imaturo. Geralmente em crianças prematuras, com baixo peso e que ao nascerem (por imaturidade pulmonar) não conseguem oxigenar adequadamente o sistema nervoso central. Frequentemente necessitam de internação prolongada em UTI neonatal.
Na maioria das vezes, as áreas envolvidas são predominantemente motoras, não havendo prejuízo na inteligência. É lógico que existem também aquelas com lesões graves no cérebro que repercute não só no controle dos movimentos, como também nas funções intelectuais. Existem exceções a regra, e nem toda criança prematura ou de baixo peso apresenta comprometimento motor durante o desenvolvimento.
A lesão cerebral é estática (não piora), porém o envolvimento articular tende a piorar se não tratado devido à desproporção no crescimento entre ossos normais e músculos espásticos (situação em que os músculos ficam em constante contração, sem relaxamento adequado, tornando-se mais rígidos), crescendo mais lentamente e gerando deformidades articulares.
O que chama atenção inicial é o atraso no desenvolvimento motor (demora a rolar, não sustenta cabeça, por exemplo), além de ter rigidez nas articulações (músculos espásticos), o que pode ser observado na manipulação diária. Algumas apresentam dificuldade de alimentação, refluxo gástrico, alterações visuais e estrabismo. É neste momento que são encaminhadas para avaliação neurológica e o diagnóstico é estabelecido.
Meu filho é especial?
Será que vai andar?
São muitas as expectativas dos pais. Neste momento é fundamental iniciar o tratamento multidisciplinar com fisioterapia (motora, respiratória, terapia ocupacional, fono) junto com a ortopedia pediátrica. Isso deveria ser a rotina, mas na prática o que vemos é que por uma série de dificuldades muitas famílias não conseguem ortopedista pediátrico capacitado para atendimento, acompanhamento, indicação de orteses adequadas, aplicação de Botox - quando indicado, e indicação cirúrgica no momento preciso.
COMEÇAM AS BARREIRAS
A ausência do ortopedista capacitado sobrecarrega o trabalho do fisioterapeuta que, muitas vezes, tem que fazer seu trabalho brilhantemente e ainda indicar orteses. Além disso, quando precisam de opinião médica capacitada, acabam ouvindo de ortopedistas generalistas, que não estão preparados para esta patologia e não se dedicam ao tratamento exclusivo de crianças. Não sabem fazer exame físico adequado de crianças espásticas e com isso começa o conflito de opiniões: um fala uma coisa e o outro fala o oposto,deixando a família perdida e sem saber em quem confiar.
CUIDADOS ORTOPÉDICOS
Desde o início é importante definir para a família o que é espasticidade e falar sobre o prognóstico do desempenho motor, classificar o grau de comprometimento motor.
O envolvimento é do corpo todo?
Só um lado do corpo é envolvido?
Embora o corpo todo seja envolvido, são os membros inferiores mais graves do que os superiores?
Avaliar o estágio do desenvolvimento motor e acompanhar a cada consulta. Monitorar o posicionamento das articulações, em especial quadris, pés e coluna vertebral, com exame físico e de imagem.
A cada consulta deve ser monitorado o grau de movimento das articulações, dando especial atenção aos quadris que, pelo desequilíbrio dos músculos tendem ao deslocamento. Suspeitamos inicialmente pela limitação nos movimentos, algumas vezes dificultando a abertura das pernas para troca de fraldas. Joelhos que não esticam completamente, e pés que ficam fixos para baixo (na ponta), também são motivos de tratamento.
Naquelas que já iniciaram a marcha, as alterações serão analisadas, algumas vezes necessitando de exame conhecido como laboratório da marcha, onde através de gravação em imagem da criança caminhando podemos definir os problemas e oferecer o melhor tratamento.
Promover proteção articular necessária com prescrição de orteses adequadas.
Indicar Botox para controle e relaxamento dos músculos mais envolvidos com protocolo de revisão semestral. Promover correção cirúrgica de deformidades em idades adequadas.
Para o pleno desenvolvimento motor, as crianças espásticas deverão ser submetidas a cirurgias ortopédicas em idades apropriadas. As correções de deformidades em quadris, joelhos e pés, muitas vezes com cirurgias combinadas onde alongamentos tendinosos e cirurgias ósseas são feitas no mesmo momento, são capazes de mudar a historia natural, fazendo com que as crianças caminhem melhor e maiores distâncias, tendo maior independência.
CUIDADO COM “AS ARMADILHAS”
O acompanhamento ortopédico é pontual. Deve iniciar logo que feito o diagnóstico e continuar regularmente a intervalos predeterminados. São os ortopedistas pediátricos que indicam as orteses adequadas, monitoram o posicionamento das articulações, indicam o momento para aplicação de Botox (para relaxamento dos músculos espásticos), assim prevenindo deformidades articulares e indicam os melhores momentos para a realização da cirurgia. O trabalho do fisioterapeuta é contínuo. A integração desses profissionais, "falando a mesma língua" é que leva ao bomtratamento.
Exijam isso dos profissionais, não sejam os intermediadores de opiniões, façam com que um profissional converse diretamente com o outro, isso vai determinar o melhor tratamento.
Não se contentem com os profissionais que definem a criança como cadeirante, sem prognóstico de marcha e que optam por não oferecer nenhum tratamento, sendo negligentes e permitindo que as deformidades piorem cada vez mais, fazendo com que a qualidade de vida da criança e da família seja afetada.
IMPORTANTE
Sempre invistam em seus filhos, as maiores dificuldades serão superadas. É muito gratificante para as famílias verem seus filhos se desenvolvendo, mesmo com algum atraso. Cada ganho, por menor que seja, é importante.
É recompensador poder ajudar e participar do trabalho para torná-los independentes para locomoção, comunicação e socialização.Melhorando a qualidade de vida dos nossos pequenos e dando-osindependência.
Portanto papais e mamães, não esqueçam: tenham total confiança em seus fisioterapeutas, eles são fundamentais. Mas tenham também ortopedista capacitado para o tratamento. Permitam que os profissionais se comuniquem, tirem suas dúvidas, percebam se as atitudes médicas estão sendo coerentes. No final a beneficiada será a criança que tanto queremos ajudar.