terça-feira, 14 de agosto de 2012

Neurociência na alfabetização

Desde meu ingresso no magistério ,(1991), tenho experimentado formas alternativas de alfabetização, especializei-me, (2002), nessa área e acredito que todos estímulos contribuem para um resultado eficiente.
Parto sempre do princípio que somos diferentes e cada um tem seu jeito próprio de apreender a leitura e escrita.
Sem dúvida que sem ler, sem falar, sem escrever, sem desenhar, sem brincar, sem tentar, sem pensar, sem errar, ninguém chegará a lugar algum.
A aprendizagem é um movimento contínuo, intermitente e complexo, tudo faz parte na sua construção, inclusive o que é abstrato, como o tempo, o afeto, a paciência, a vontade e o amor.
Magda Cunha

Fonte: Revista Época

 "A neurociência deve ir para a sala de aula" Stanislas Dehaene
O cientista condena o construtivismo como método de alfabetização e diz como os estudos com cérebro podem ajudar disléxicos a ler

FLÁVIA YURI

NEURÔNIOS  EM ATIVIDADE O neurocientista  Stanislas Dehaene em  congresso na França.  Há 20 anos, ele estuda  o impacto dos números  e das letras no cérebro  (Foto: divulgação)
                           NEURÔNIOS EM ATIVIDADE  O neurocientista Stanislas Dehaene em congresso na França.
                           Há 20 anos, ele estuda o impacto dos números e das letras no cérebro (Foto: divulgação)

Uma das tarefas comuns da ciência é desvendar a complexidade por trás de atividades aparentemente simples. O matemático e neurocientista francês Stanislas Dehaene dedica-se a decifrar as mudanças cerebrais causadas pelo ato de ler. Para ele, a leitura moldou o cérebro humano e preparou-o para assimilar habilidades impossíveis de ser aprendidas por iletrados. Em seu livro Os neurônios da leitura (Editora Penso, R$ 71), ele afirma que o conhecimento do impacto da leitura no cérebro pode melhorar métodos de alfabetização para crianças e dá exemplos de como esse conhecimento tem auxiliado pessoas com dislexia. E mais: Dehaene diz que a pedagogia do construtivismo, altamente disseminada no Brasil, pode ser ineficaz para o ensino da leitura.


ÉPOCA – O que suas pesquisas sobre o impacto da leitura no cérebro revelaram?
Stanislas Dehaene – Constatamos que nosso cérebro aprendeu a ler a partir de uma reciclagem dos neurônios. Isso quer dizer que neurônios usados na leitura antes eram empregados em outro tipo de tarefa. Nosso cérebro de primata não teve tempo de amadurecer para aprender a ler. A leitura só foi possível porque conseguimos adaptar os símbolos a formas já conhecidas há milhares de anos. Diferentemente do que disse John Locke, nossa cabeça não é uma página em branco pronta para aprender qualquer tipo de coisa. Esse é um exemplo de como a cultura se adaptou às possibilidades de nossa mente. Concluímos que a leitura despertou em nosso cérebro a capacidade de perceber diferenças sutis e aumentou nossa capacidade de memorizar informações. É interessante observar que o cérebro mobiliza a mesma área para a leitura de qualquer idioma. O processamento da leitura do chinês ou do hebraico, da direita para a esquerda, acontece na mesma região que decodifica o inglês, o francês e o português.

ÉPOCA – O senhor disse que a leitura usou uma parte do cérebro antes destinada a outras funções. Que funções eram essas e o que aconteceu com elas?
Dehaene – Antes de aprendermos a ler, usávamos essa parte do cérebro para reconhecer formas de objetos e de rostos. Se você escanear o cérebro de pessoas que não leem e comparar com as alfabetizadas, a identificação de rostos para as iletradas mobiliza uma parte maior do cérebro que a mesma função nas alfabetizadas. Existe certa competição de competências na mesma região do cérebro. É como se ele tivesse de abrir espaço para a leitura.

ÉPOCA – Isso quer dizer, nesse exemplo, que o cérebro letrado passou a usar um número menor de neurônios para a mesma função? Isso tem impacto na qualidade da função?
Dehaene – Não temos provas científicas de que ocorra perda de competência. Um mesmo neurônio pode ter um número desconhecido de sinapses, de acordo com o estímulo do ambiente. Mas essa é uma suposição lógica. Afinal, temos de dividir um mesmo número de neurônios em várias atividades. Nosso grupo de pesquisas na Amazônia mostrou que o cérebro de pessoas que não leem tem habilidades relacionadas à noção espacial e de matemática muito avançadas. Não temos dados científicos que provem que eles sejam melhores nessas tarefas porque não leem. Mas essa é uma possibilidade.

ÉPOCA – De que forma suas descobertas podem auxiliar no processo de educação?
Dehaene – Verificamos, por meio de várias experiências, que o método mais eficaz de alfabetização é o que cha-mamos fônico. Ele parte do ensino das letras e da correspondência fonética de cada uma delas. Nossos estudos mostraram que a criança alfabetizada por esse método aprende a ler de forma mais rápida e eficiente. Os métodos de ensino que seguem o conceito de educação global, por outro lado, mostraram-se ineficazes. (No método global, a criança deve, primeiro, aprender o significado da palavra e, numa próxima etapa, os símbolos que a compõem.)
Jogos simples de leitura, de rimas e de troca de sons podem ajudar crianças com dislexia a ler.
 

ÉPOCA – No Brasil, o construtivismo, que segue as premissas do método global para a alfabetização, é amplamente disseminado. Por que os sistemas que seguem o método global são ineficazes?
Dehaene – Verificamos em pesquisa com pessoas de diferentes idiomas que o aprendizado da linguagem se dá a partir da identificação da letra e do som correspondente. No português, a criança aprende primeiro a combinação de consoantes e vogais. A próxima etapa é entender a combinação entre duas consoantes e uma vogal, como o “vra” de palavra. Essa composição de formas, do menor para o maior, é feita no lado esquerdo do cérebro. Quando se usam metodologias para a alfabetização que seguem o método global, no qual a criança primeiro aprende o sentido da palavra, sem necessariamente conhecer os símbolos, o lado direito é ativado. Mas a deco-dificação dos símbolos terá de chegar ao lado esquerdo para que a leitura seja concluída. É um processo mais demorado, que segue na via contrária ao funcionamento do cérebro. Num certo sentido, podemos dizer que esse método ensina o lado errado primeiro. As crianças que aprendem a ler processando primeiro o lado esquerdo do cérebro estabelecem relações imediatas entre letras e seus sons, leem com mais facilidade e entendem mais rapidamente o significado do que estão lendo. Crianças com dislexia que começam a treinar o lado esquerdo do cérebro têm muito mais chances de superar a dificuldade no aprendizado da leitura.

ÉPOCA – É possível quantificar esse atraso de leitura que o senhor menciona?
Dehaene – Quanto mais próxima for a correspondência da letra com o som, mais fácil para um indivíduo automatizar a ação de ler. Português e italiano são idiomas muito transparentes, pois cada letra corresponde a um som. Inglês e francês são línguas em que a correspondência de sons pode variar bastante. Pesquisas mostram que, ao ter aulas regulares, todos os dias, na escola, a criança leva dois anos a mais para dominar o inglês que para dominar o italiano.

ÉPOCA – É possível identificar diferenças no cérebro de quem consegue ler palavras e frases, mas tem dificuldade na interpretação de textos (no Brasil, eles são conhecidos como analfabetos funcionais) em relação a alguém que lê e interpreta o conteúdo com fluência?
Dehaene – Não identificamos isso em pesquisa de imagens. Mas a dificuldade que algumas pessoas têm de interpre-tar o que leem ocorre basicamente porque elas ainda não automatizaram a decodificação das palavras. Decodificar pede esforço para quem não tem essa função bem desenvolvida. Isso mobiliza completamente a atenção e os es-forços de quem está lendo, a ponto de não conseguir se concentrar na mensagem. A solução para melhorar a in-terpretação de texto é automatizar a leitura. Por isso, é importante que crianças pequenas leiam de forma regular até que isso se torne uma rotina. As crianças começam a interpretar textos com eficiência depois que a leitura se torna um processo automatizado.

ÉPOCA – Aprender a ler partituras tem o mesmo efeito para o cérebro que ler palavras?
Dehaene – As áreas do cérebro usadas para ler letras não são exatamente as mesmas usadas para decodificar mú-sica. Não há muitos estudos sobre a parte cerebral usada no aprendizado de música. Mas há diversas pesquisas sobre o efeito da música na vida das crianças. Crianças que aprendem música desenvolvem habilidades escolares avançadas, especialmente no domínio da leitura. Elas têm mais facilidade para se concentrar. Aprender música aumenta os níveis de inteligência (Q.I.). Aprender música é uma forma excelente de desenvolver o cérebro, espe-cialmente o de crianças.

ÉPOCA – Pessoas com dislexia leem de forma diferente ou apenas mais devagar?
Dehaene – Pessoas com dislexia tendem a ter problemas com a conexão entre letra e som. É muito difícil para elas entender essa ligação. Em parte, porque não podem distinguir muito bem as diferenças dos sons da língua. Elas têm problemas com fonologia. Não com o som de letras como a, b, c e d. Mas com o som da linguagem, como dã, bã e pã. Há diferentes tipos de dislexia. Há pessoas que têm dificuldade em enxergar as letras em determinados lugares da palavra ou em visualizar símbolos específicos. O que os disléxicos têm em comum é a dificuldade em criar o mapa dos símbolos e dos sons.

ÉPOCA – Sua pesquisa pode ajudá-los de alguma forma?
Dehaene – Antes não era óbvio que a maioria dos disléxicos tinha problemas com os sons da linguagem. Agora que sabemos disso, começamos a trabalhar com jogos de reabilitação com ótimos resultados. É possível ajudar as crianças com dislexia com jogos de leitura, de rimas ou brincadeiras de mudar sílabas. Pode-se brincar de trocar o som de “bra” de Brasil por “dra” ou “pra”. Vimos que brincadeiras orais fáceis têm facilitado o aprendizado.

ÉPOCA – Que resultados esse tipo de exercício já produziu?

Dehaene – Constatamos com exames de imagem que partes do cérebro não usadas em pessoas com dislexia passam a ser exercitadas com esse tipo de atividade. Isso as ajuda a perceber os sons da linguagem, o que é muito importante para o aprendizado da leitura. Para surtir resultados, é importante aplicar esses jogos todos os dias, de forma intensiva.

ÉPOCA – Se o cérebro dos disléxicos é organizado de forma diferente, isso sugere que
eles possam ter outras habilidades que alguém sem a dislexia não tem?
Dehaene – Essa é uma questão interessante. Assim como há a possibilidade de perdermos algumas habilidades quando aprendemos a ler, existe a possibilidade de o cérebro disléxico ter facilidade com algumas áreas. Ainda faltam pesquisas para podermos constatar isso. Mas estudos sugerem que o senso de simetria do disléxico pode ser mais desenvolvido, e isso ajuda em matemática. Sabemos que há muitos disléxicos que podem ser bons em matemática. Estudos sugerem que eles podem enxergar padrões sofisticados com mais facilidade.

ÉPOCA – Pode haver gênios em matemática que não sabem ler?
Dehaene – Isso é algo muito, muito raro. Pode haver pessoas iletradas muito boas em cálculos. Mas elas não serão gênios em matemática sem ler. Para avançar em matemática, a pessoa precisa entender diferenças sutis num nível muito sofisticado. É justamente a percepção dessas diferenças sutis que a leitura ativa no cérebro. Ler é uma habilidade extraordinária que pode transformar o cérebro e prepará-lo para outros níveis de aprendizado. Não dá para ir muito longe sem leitura.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Fotofobia e Aprendizagem


Minimizar as dificuldades para aprendizagem não é tarefa fácil, exige comprometimento do educador para além da dinâmica da aula e qualidade do conteúdo.

O texto que segue é sobre um transtorno de aprendizagem que pode ser sanado com a observação do alunado, orientação às famílias e encaminhamento ao serviço médico adequado.

Trata-se da Síndrome de Irlen, referente a um distúrbio na visão, acometido pela  luz natural ou artificial, para práticas de leitura e escrita.

De total importância deve ser amplamente divulgado por todas as mídias sociais.

Magda Cunha

Fonte:
Marina Roberta Vieira Nogueira  -  marinaroberta2@gmail.com
Desenvolvimento de projetos e pesquisas ligadas à Síndrome de Irlen e Síndrome da Deficiência Postural
Fisioterapeuta graduada pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Pós- graduanda do curso de Neurociências e Psicanálise aplicadas à Educação pela Universidade São Camilo- BH
Screening do Método Irlen
Visão, aprendizagem e a Síndrome de Irlen

O ato de aprender é próprio do ser humano, porém a qualidade e a quantidade dos novos saberes dependerão muito dos estímulos recebidos e principalmente da eficácia de cada um deles. Grande parte desses fatores de influência são originários do meio social, no qual o indivíduo está inserido, porém há que se considerar limitações físicas ou predisposições pessoais que cada um carrega em seu próprio código genético (FONSECA, 2004).

Estima-se que cerca de 85% de tudo o que aprendemos ou assimilamos do ambiente, bem como o desenvolvimento normal sensorial e motor, dependem de nossas habilidades visuais nos primeiros seis meses de vida (ATKINSON, 2000 e SHOR, 1989).

São vários os transtornos, síndromes e déficits que dificultam a aprendizagem, dentre os quais estão os distúrbios de aprendizagem relacionados à visão, que correspondem a uma dificuldade na manutenção da atenção, compreensão e memorização e à atividade ocular durante a leitura, levando a um déficit de aprendizado. Tais distúrbios afetam indivíduos de todas as idades, com inteligência normal ou superior à média e está relacionada a uma desorganização no processamento cerebral das informações recebidas pelo sistema visual. O esforço despendido nesse processamento, torna a leitura mais lenta e segmentada, o que compromete a velocidade de cognição e a memorização.
Um desses distúrbios de aprendizagem relacionados à visão é a Síndrome de Irlen (SI), que se caracteriza por dificuldades de processamento cerebral das informações visuais, causadas pela sensibilidade a determinados comprimentos de ondas de luz espectral visível ao olho humano (IRLEN, 1991).

Tal disfunção perceptual apresenta seis manifestações principais:
1 fotossensibilidade (sensibilidade aumentada a luz),
2 desfocamento à leitura com distorções visuais,
3 restrição do campo visual periférico,
4 dor de cabeça,
5 dificuldade de adaptação a contrastes e
6 na manutenção da atenção.
Alguns sintomas físicos recorrentes são:
1 lacrimejamento,
2 coceira e ardência ocular,
3 esfregar os olhos constantemente,
4 tampar/fazer sombra nos olhos enquanto lê,
5 apertar e piscar os olhos excessivamente,
6 balançar ou tombar a cabeça,
7 cansaço após 10 a 15 minutos de leitura e
8 leitura na penumbra.(GUIMARÃES, 2009)
A Síndrome de Irlen pode afetar além da leitura, outras áreas variadas da vida do indivíduo. A sensibilidade à luz pode causar desde simples incômodos em determinados ambientes ou circunstâncias, até prejuízos em habilidades, tais como: prática de esporte com bola, coordenação motora fina e grossa, habilidades musicais, coordenação espaço temporal, dentre outras (IRLEN, 1991).

Um indivíduo mesmo que com a acuidade visual dentro dos padrões de normalidade (ou seja, enxergando bem) tem chances de ser portador da síndrome, já que se trata de uma disfunção da percepção e não uma patologia ligada diretamente aos olhos. Ela está relacionada a déficits na codificação e decodificação das informações visuais pelo sistema nervoso central (AMEN, 2004). É necessário um diagnóstico diferencial por profissionais especializados, uma vez que não pode ser detectada através de exames oftalmológicos de rotina, nem por testes padronizados para verificação de dificuldades de aprendizagem (IRLEN, 1991).

De forma simplificada, a Síndrome de Irlen se manifesta da seguinte forma:
A população afetada pela Síndrome de Irlen se resume em 12-14% da população geral, superdotados e bons leitores; 46% de indivíduos com déficits específicos de aprendizagem e leitura; 33% dos casos de TDA e TDAH, Dislexia e comportamentais e 55% dos indivíduos com traumatismos cranianos, concussões, lesão contragolpe, etc (GUIMARÃES, 2009).

O protocolo de diagnóstico da Síndrome de Irlen é realizado através de uma abordagem multidisciplinar, com contribuição de diversas áreas, como: oftalmologia, psicologia, psicopedagogia, fonoaudiologia e terapia ocupacional. Tal protocolo envolve entrega de questionários caracterização e habilidades acadêmicas, anamnese, exames oftamológicos específicos, screening (avaliação para constatação de distorções visuais no processo de leitura pela metodologia Irlen) e diagnóstico do padrão de leitura avisando intervenções psicopedagógicas, oftalmológicas, neurológicas, etc.

O Método Irlen de tratamento oferece aos portadores da Síndrome de Irlen diminuição da sintomatologia ou em alguns casos sua eliminação completa. É válido ressaltar que não se trata de intervenção medicamentosa, nem invasiva, mas sim propõe dois tipos abordagem (IRLEN, 1991):
1. Uso de overlays – lâminas de sobreposição. Objetivos: proporcionar conforto, nitidez, estabilidade e fluência durante a leitura. Tratamento proposto pelo atual projeto.
2. Filtros de bloqueio espectral (em óculos ou lentes de contato) – prescrição exclusiva de oftalmologista.
Hoje o método Irlen de tratamento vem sendo utilizado em quarenta e dois países e em mais de quatro mil instituições de ensino. Nos Estados Unidos uma resolução adotada em Julho de 2009, durante a Assembléia Geral de NEA – National Education Association, que agrega aproximadamente 3 milhões de trabalhadores na área da educação foi aprovada a proposta de que todos os seus membros sejam informados sobra a Síndrome de Irlen e seu tratamento. Outros locais aonde os testes já vem sendo aplicados como de rotina são: Austrália e Reino Unido (GUIMARÃES, 2009)

No Brasil, a Síndrome de Irlen é conhecida há apenas quatro anos através de cursos oferecidos pela Fundação do Hospital de Olhos de Minas Gerais, em módulos teórico-práticos sobre a metodologia de diagnóstico e tratamento. A rede de profissionais capacitados é composta por cerca de 530 profissionais de diversas áreas da saúde e educação. Esses indivíduos capacitados são conhecidos como screeners em 16 estados brasileiros.

Mais informações encontram- se disponíveis no site: Dislexia de Leitura
Referências
·         ALMADA, A. Síndrome de Irlen: Uma Nova Abordagem para Dificuldades de Aprendizagem. Escola Superior Aberta do Brasil. Pós-graduação Lato Sensu em Psicopedagogia Clínico- Institucional. Vila Velha. E.S., 2009.

·        AMEN, D.G. Light in the Brain. Brain in the News Newsletter.30/06/2004
·         American Academy of Child and Adolescent Psychiatry (AACAP). Practice parameters for the assessment and treatment of children, adolescents and adults with Attention Deficit/hyperactivity disorder. J Am Acad Adolesc Psychiatry 1997;36 (10 Suppl):85S-121S.
·         American Psychiatric Association. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders. 4th ed. Washington: American Psychiatric Association; 1994.
·         ATKINSON, J. The Developing Visual Brain. New York: Oxford University Press, 2000.
·         Dislexia de Leitura. Informações e artigos. Disponíveis na Internet em Dislexia de Leitura.
·         FONSECA, Vítor. Dificuldades de aprendizagem: Abordagem Neuropsicológica e Psicopedagógica ao Insucesso Escolar. 3ª Edição. Âncora Editora, 2004.
·         GUIMARÃES, Márcia; e GUIMARÃES, Ricardo. Palestras ministradas no VI Curso de Dislexia de Leitura da Fundação Hospital de Olhos, realizada em Belo Horizonte, MG, nos dias 9, 10 e 11 de julho de 2009.
·         Instituto Irlen Internacional. Informações e Artigos. Disponíveis na Internet em Irlen
·         IRLEN, Helen. Reading by the Colors- Overcoming Dyslexia and Other Reading Disabilities Through the Irlen Method. New York: Avery, 1991 (Updated Edition, New York: Penguin Group 2005)
·         RICHMAN, J. Use of Sustained Attetion Task to Determine Children at Risk for Learning Problems. J Am Optom Assoc.; 57, 20-6. 1986.
·         SCHOR ,C. ROSENBLOOM, A. e MORGAN, M. Visuomotor Development. In Principles and Practices of Pediatric Optometry. Philadelphia: JB Lippincott, 1989.
·         VOHS, K.D., and R. F. BAUMEISTER,2004. Understanding Self- Regulation. Handbook of Self- Regulation: Research, Theory and Applications. ed. R. F. Baumeister e K. D. Vohs. New York: Guilford Press.

Abaixo endereços para acessar vídeos reportagens sobre a Síndrome de Irlen:


Visão de um cego ...


São muitas reflexões a cerca desta obra literária, entretanto o que mais tocou-me foi a vidência do cego, que sem aproveitar-se visualmente da claridade, a defendeu com a mais cega pertinência.
A luz é apresentada na versão de alguém que dela nunca usufruiu é um bonito paradoxo, colocado de forma poética.
Esse texto tem muito a ver com o contexto do deficiente visual  no  Brasil, vale ser lido,  assistido, ouvido, comentado e sobretudo refletido.
Uma bela contribuição de Alcântara Machado.

Magda Cunha

Fonte: © Projeto Releituras  Arnaldo Nogueira Jr  e  Movimento Livre



Alcântara Machado

Apólogo Brasileiro sem Véu de Alegoria
Alcântara Machado

O trenzinho recebeu em Magoarí o pessoal do matadouro e tocou para Belém. Já era noite. Só se sentia o cheiro doce do sangue. As manchas na roupa dos passageiros ninguém via porque não havia luz. De vez em quando passava uma fagulha que a chaminé da locomotiva botava. E os vagões no escuro.

Trem misterioso. Noite fora, noite dentro. O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro na boca. Chegava a passagem bem perto da ponta acesa e dava uma chupada para fazer mais luz. Via mal e mal a data e ia guardando no bolso. Havia sempre uns que gritavam :

— Vai pisar no inferno!

Ele pedia perdão (ou não pedia) e continuava seu caminho. Os vagões sacolejando.

O trenzinho seguia danado para Belém porque o maquinista não tinha jantado até aquela hora. Os que não dormiam aproveitando a escuridão conversavam e até gesticulavam por força do hábito brasileiro. Ou então cantavam, assobiavam. Só as mulheres se encolhiam com medo de algum desrespeito.

Noite sem lua nem nada. Os fósforos é que alumiavam um instante as caras cansadas e a pretidão feia caía de novo. Ninguém estranhava. Era assim mesmo todos os dias. O pessoal do matadouro já estava acostumado. Parecia trem de carga o trem de Magoarí.
* * *
Porém, aconteceu que no dia 6 de maio viajava no penúltimo banco do lado direito do segundo vagão um cego de óculos azuis. Cego baiano das margens do Verde de Baixo. Flautista de profissão dera um concerto em Bragança. Parara em Magoarí. Voltava para Belém com setenta e quatrocentos no bolso. 0 taioca guia dele só dava uma forga no bocejo para cuspir.

Baiano velho estava contente. Primeiro deu uma cotovelada no secretário e puxou conversa. Puxou à toa porque não veio nada. Então principiou a assobiar. Assobiou uma valsa (dessas que vão subindo, vão subindo e depois descendo, vêm descendo), uma polca, um pedaço do Trovador. Ficou quieto uns tempos. De repente deu uma coisa nele. Perguntou para o rapaz:

— O jornal não dá nada sobre a sucessão presidencial?

O rapaz respondeu:

— Não sei: nós estamos no escuro.

— No escuro?

— É.

Ficou matutando calado. Claríssimo que não compreendia bem. Perguntou de novo:

— Não tem luz?

Bocejo.

— Não tem.
Cuspada.
Matutou mais um pouco. Perguntou de novo:
— 0 vagão está no escuro?

— Está.

De tanta indignação bateu com o porrete no soalho. E principiou a grita dele assim:

— Não pode ser! Estrada relaxada! Que é que faz que não acende? Não se pode viver sem luz! A luz é necessária! A luz é o maior dom da natureza! Luz! Luz! Luz!

E a luz não foi feita. Continuou berrando:

— Luz! Luz! Luz!

Só a escuridão respondia.

Baiano velho estava fulo. Urrava. Vozes perguntaram dentro da noite:

— Que é que há?

Baiano velho trovejou:

— Não tem luz!

Vozes concordaram:

— Pois não tem mesmo.
* * *
Foi preciso explicar que era um desaforo. Homem não é bicho. Viver nas trevas é cuspir no progresso da humanidade. Depois a gente tem a obrigação de reagir contra os exploradores do povo. No preço da passagem está incluída a luz. O governo não toma providências? Não toma? A turba ignara fará valer seus direitos sem ele. Contra ele se necessário. Brasileiro é bom, é amigo da paz, é tudo quanto quiserem: mas bobo não. Chega um dia e a coisa pega fogo.

Todos gritavam discutindo com calor e palavrões. Um mulato propôs que se matasse o chefe do trem. Mas João Virgulino lembrou:

— Ele é pobre como a gente.

Outro sugeriu uma grande passeata em Belém com banda de música e discursos.

— Foguetes também?
— Foguetes também.
— Be-le-za!

Mas João Virgulino observou:
— Isso custa dinheiro.

— Que é que se vai fazer então? Ninguém sabia. Isto é: João Virgulino sabia. Magafere-chefe do matadouro de Magoarí, tirou a faca da cinta e começou a esquartejar o banco de palhinha. Com todas as regras do ofício. Cortou um pedaço, jogou pela janela e disse:

— Dois quilos de lombo!
Cortou outro e disse:

— Quilo e meio de toicinho!

Todos os passageiros magarefes e auxiliares imitaram o chefe. Era cortar e jogar pelas janelas. Parecia um serviço organizado. Ordens partiam de todos os lados. Com piadas, risadas, gargalhadas.

— Quantas reses, Zé Bento?

— Eu estou na quarta, Zé Bento!

Baiano velho quando percebeu a história pulou de contente. O chefe do trem correu quase que chorando.

— Que é isso? Que é isso? É por causa da luz? Baiano velho respondeu :

— É por causa das trevas!

O chefe do trem suplicava:

— Calma ! Calma ! Eu arranjo umas velinhas.
João Virgulino percorria os vagões apalpando os bancos.

— Aqui ainda tem uns três quilos de colchão mole!
0 chefe do trem foi para o cubículo dele e se fechou por dentro rezando. Belém já estava perto. Dos bancos só restava a armação de ferro. Os passageiros de pé contavam façanhas. Baiano velho tocava a marcha de sua lavra chamada Às armas cidadãos! 0 taioquinha embrulhava no jornal a faca surrupiada na confusão.

Tocando a sineta o trem de Magoarí fundou na estação de Belém. Em dois tempos os vagões se esvaziaram. O último a sair foi o chefe, muito pálido.
* * *
Belém vibrou com a história. Os jornais afixaram cartazes. Era assim o título de um: Os passageiros no trem de Magoarí amotinaram-se jogando os assentos ao leito da estrada. Mas foi substituído porque se prestava a interpretações que feriam de frente o decoro das famílias. Diante da Teatro da Paz houve um conflito sangrento entre populares.

Dada a queixa à polícia foi iniciado o inquérito para apurar as responsabilidades. Perante grande número de advogados, representantes da imprensa, curiosos e pessoas gradas, o delegado ouviu vários passageiros. Todos se mantiveram na negativa menos um que se declarou protestante e trazia um exemplar da Bíblia no bolso. O delegado perguntou:

— Qual a causa verdadeira do motim?

O homem respondeu:

— A causa verdadeira do motim foi a falta de luz nos vagões.

O delegado olhou firme nos olhos do passageiro e continuou:

— Quem encabeçou o movimento?
Em meio da ansiosa expectativa dos presentes o homem revelou:

— Quem encabeçou o movimento foi um cego!

Quis jurar sobre a Bíblia mas foi imediatamente recolhido ao xadrez porque com a autoridade não se brinca.

 Antônio Castilho de Alcântara Machado de Oliveira (1901-1935) era o nome completo do autor de "Pathé-Baby", "Brás, Bexiga e Barra Funda", "Mana Maria" e "Cavaquinho e saxofone". Bacharel em direito, filho do professor e político Alcântara Machado, preferiu enveredar pela carreira jornalística e, em 1927, aos 26 anos de idade, era um dos redatores destacados dos "Diários Associados", em São Paulo. O jornalismo, entretanto, não o absorveu inteiramente. Consagrou-se também às letras, surgindo como uma das figuras mais expressivas do movimento modernista. Em 1934, veio para o Rio de Janeiro, onde passou a dirigir o "Diário da Noite". Estava nesse posto jornalístico quando, a 14 de abril de 1935, faleceu na Casa de Saúde de São Sebastião, ao ser operado em conseqüência de uma crise aguda de apendicite. Distinguiu-se pela vivacidade da linguagem, pela novidade do estilo, pela fiel reprodução dos tipos e costumes paulistas, bem como pela sátira acerada e certeira com que alvejava os nossos ridículos. Nos deixou, ainda, a comédia "O Nortista", e o livro de contos "Laranja da China".(in "Antologia do Humorismo e Sátira", Editora Civilização Brasileira - Rio de Janeiro, 1957, pág. 359).


Download do vídeo: http://www.megaupload.com/?d=MWTHRH2G




... veja mais  em  http://www.movimentolivre.org/




Audiodescrição X Arte

Belíssimo trabalho, merece muita divulgação e apoio ...

Magda Cunha

"Composição com Vermelho, Amarelo e Azul", de Piet Mondrian - 1921
 
Descrição da imagem:
Composição com Vermelho, Amarelo e Azul, é um óleo sobre tela, que mede 59,5 x 59,5 centímetros e pertence ao Haags Gemeentemuseum, que mantém o Museu Escher, localizado em Haia, na Holanda.
A tela, um quadrado perfeito, exibe um cruzamento de linhas, em ângulos retos, na vertical e ...
 
... só um gostinho, veja mais no link abaixo ...
Exposição Arte Descrita

A técnica de audiodescrição tornou acessíveis algumas imagens de obras consagradas da história das artes visuais que fazem parte do acervo do artedescrita.blogspot.com, do professor e pesquisador Thiago Cerejeira, que em 2011 deu início ao projeto deste espaço virtual inclusivo dedicado à arte e à acessibilidade.
O Blog é um espaço que permite a análise e tradução visual de diversas formas de manifestações artísticas inerentes às Artes Visuais, Cênicas, Arquitetura, Música, Moda e Design. O objetivo é oferecer à pessoas com deficiência visual e a todos os apreciadores de arte e cultura a oportunidade de, através da áudio-descrição, interagir entre si, expondo suas críticas e opiniões.
A áudio-descrição da exposição Arte Descrita, é uma iniciativa do Blog Arte Descrita em parceria com a Midiace. As obras áudio-descritas são de períodos e movimentos artísticos distintos e procuraram contemplar estilos diversificados. O roteiro é assinado por Thiago Cerejeira e revisado por Jacqueline Cerejeira. A narração foi produzida através de recurso de voz sintetizada.
O autor, Thiago Cerejeira, é Arte-educador, Professor e Pesquisador de Moda e Design, e decidiu se dedicar ao estudo da áudio-descrição após ter adquirido deficiência visual, considerada como baixa visão, em 2010. Importante ressaltar que o autor desenvolve este trabalho de forma experimental e que não possui formação específica nesta área, tendo constituído seu processo de aprendizagem basicamente por prática autodidata e através da participação no grupo de discussão "Áudio-descrição em estudo", coordenado pelo professor Francisco Lima do CEI - Centro de Estudos Inclusivos da UFPE.
A exposição contempla doze imagens de obras emblemáticas que vão desde a Arte Egípcia, passando pelo Renascimento até a Contemporaneidade.
Contato e referências:

Tecnologia x Inclusão visual

Visitei este site e recomendo pela variedade, qualidade e relevância de suas postagens.
Gostei muito!

Magda  Cunha

  

Fonte: Portal Nacional de Tecnologia Assistiva  www.assistiva.com.br

Novo software gratuito aproxima o deficiente visual do mundo virtual

Leitor de tela NVDA, apesar de pouco divulgado, é eficiente e não deixa a desejar

O número de brasileiros que acessam a internet bateu a marca de 79,9 milhões, segundo pesquisa do IBOPE. Gilberto Ferreira, 49 anos, é aposentado e faz parte desta estatística.

No entanto, ele também é um dos 6,5 milhões de deficientes visuais do Brasil e navega na internet por meio de leitores de tela.

Basicamente trata-se de um programa que lê e fala as informações que estão expostas na tela do computador, tornando-o acessível.

O deficiente visual não utiliza o mouse, apenas o teclado, seguindo as referências das teclas, conforme os princípios da datilografia edigitação.

Mas a tecnologia assistiva, que é um direito de todos, nem sempre é barata. Muitos leitores de tela são caros, impossibilitando a aquisição até mesmo de empresas, sendo um dos motivos para a não contratação dos deficientes visuais.

Há dois anos Gilberto descobriu o NVDA, NonVisual Desktop Access ou Acesso Não-Visual ao Ambiente de Trabalho, um software gratuito que pode ser baixado pela própria internet.

“Descobri por curiosidade através de pesquisas. Instalei no meu computador e deu certo”, conta o aposentado. O NVDA faz parte da aula de informática do Lar das Moças Cegas há um ano.

A professora Maria Aparecida Pin explica que o programa é simples de usar, basta memorizar O NVDA faz parte da aula de informática do Lar das Moças Cegas há um ano os comandos do Windows, que são praticamente os mesmos.

“É questão de prática. Quem mexe no Windows, mexe em qualquer leitor de tela, inclusive no NVDA”.

Para a professora Fabiana Santos, que também ministra aulas de informática no LMC, mas com o objetivo de incluir o aluno no mercado de trabalho, diz que a oportunidade do deficiente visual acessar a internet proporciona autonomia e independência, já que as redes sociais, os sites e os programas de computador fazem parte do cotidiano de todos na atualidade.

“Nossos alunos, que tem computador em casa, possuem o NVDA instalado, nós o indicamos.

Acessar o mundo virtual muitas vezes serve como distração para eles, assim como é para quem tem a visão normal”, explica.

Outra vantagem do NonVisual Desktop Access é a versão portátil. Gilberto, por exemplo, carrega consigo, no bolso da calça, o pendrive com o programa.

Desta forma, consegue utilizar em qualquer lugar. “Muitas vezes meus colegas me chamam para instalar programas no computador e eu só espeto o pendrive e faço o que quero. Isso é muito bom”, exemplifica sorrindo Gilberto.

O NVDA começou a ser desenvolvido em 2006 na Austrália por Michael Curran, que também é cego.

Até hoje, apesar de ser gratuito e não deixar a desejar, o programa é pouco divulgado e, com o tempo, vem conquistando espaço nas casas, empresas e instituições onde ficam os deficientes visuais.

“Tudo o que é novo assusta um pouco. O pessoal desconfia e não sabe se funciona direito. Eu garanto que funciona”, finaliza o aposentado.

Fonte:



Gangliosidose tipo 2 x Amor


O amor é determinante no ganho de diversas causas, isso não é exceção, é a regra.
Haja vista que o estudo por parte de um leigo, mas com foco na cura do filho, encontra uma possibilidade de tratamento.
Pela sua raridade, a gangliosidose, não acomete  parcela expressiva da sociedade e portanto não tem pesquisa em curso para sua cura.
Mas para alguns  o fim da linha é o maior impulso para recomeçar.
Esse pai fez de um limão azedo uma boa limonada.
Trouxe esperança para cura.

Magda Cunha

 Fonte:  Estadão.com.br
A luta do pai pela cura de Vitor

Engenheiro abandona emprego, estuda literatura médica por conta própria e descobre fórmula para produzir enzima que retarda evolução da doença do filho

12 de agosto de 2012 | 3h 07

Denis Ferreira Netto/AE


Amor de pai. Adolfo e o filho Vitor, em Curitiba - Denis Ferreira Netto/AE
Denis Ferreira Netto/AE
Amor de pai. Adolfo e o filho Vitor, em Curitiba

Entre abril de 1999 e maio de 2000, o engenheiro mecânico Adolfo Celso Guidi, de 54 anos, abriu mão de sua vida pessoal, separou-se da mulher, abandonou o emprego e se enfurnou na biblioteca da Universidade Federal do Paraná (UFPR), onde se debruçou sobre livros de medicina.

O objetivo era nobre e urgente: Adolfo corria contra o tempo para entender o mecanismo de ação da gangliosidose do tipo 2, doença genética rara, neurodegenerativa e sem cura, que havia sido recém-diagnosticada em seu filho, Vitor, que na época tinha apenas 10 anos. Descrentes, os médicos deram mais um ano de vida ao menino.

E Guidi conseguiu. Sozinho, depois de ler mais de 30 livros de medicina - incluindo áreas sobre genética, neurologia e fisiologia -, ele não apenas entendeu como a doença agia no organismo de seu filho, mas descobriu uma fórmula que retardou sua evolução. Contrariando a literatura médica - que aponta 11 anos de vida aos portadores de gangliosidose tipo 2 -, Vitor está vivo e hoje tem 23 anos.

O começo. Vitor foi uma criança normal, saudável e ativa até os seus 4 anos. Precoce, ele deu os primeiros passos sem nem mesmo engatinhar. Aos 4 anos e meio, porém, passou a apresentar os primeiros sinais degenerativos: não conseguia mais segurar o lápis. Foi perdendo a força e a coordenação motora fina. E só piorou.

Na escola, a professora dizia que Vitor atrapalhava a aula. Suspeitaram de déficit de atenção. Os pais o mudaram de escola e o mandaram para a terapia. Aos 5 anos, Vitor foi matriculado em uma escola especial - já não era mais aceito em escolas comuns.

Os sintomas continuaram se agravando, e Vitor já não tinha mais coordenação motora. Aos 8, teve sua primeira crise grave, durante um passeio no shopping. Levado às pressas ao hospital, não respondia aos estímulos de dor nem de acuidade visual. "Ele não sentia nada. Depois, eu soube que foi a primeira grande perda neuronal que ele sofreu."

A família foi orientada a procurar ajuda nos EUA, mas, sem dinheiro para isso, a saída foi enviar amostras de material genético ao exterior em busca de respostas que jamais vieram, pois as desconfianças dos médicos nunca eram confirmadas.

O diagnóstico. Adolfo decidiu, então, viajar com o filho à Argentina para consultar um dos maiores especialistas em genética do mundo. Ficaram lá por uma semana, fizeram uma série de exames de sangue, de urina, de imagem. Tudo com o dinheiro da rescisão - ele era gerente de uma concessionária. "Tinha um emprego bom e umas economias. Raspei tudo e gastei cerca de US$ 65 mil. Só um dos exames custou US$ 5 mil", conta.

O resultado veio em três semanas: Vitor tinha gangliosidose tipo 2, doença que, entre outras coisas, provoca defeitos em um tipo de enzima que não degrada um lipídio que deveria ser naturalmente eliminado pelo corpo, provocando um acúmulo prejudicial.

De tão raro, o caso de Vitor foi debatido em congressos. Os exames foram refeitos. E o prognóstico era realmente desanimador. "Os médicos disseram que, pelas estatísticas, Vitor teria menos de um ano de vida. Como eu viveria dali para a frente sabendo que meu filho iria morrer?"

Inconformado com a possibilidade da perda, Adolfo decidiu estudar a fundo a doença - que até então não tinha tratamento. Foi nessa época que ele passou a frequentar a biblioteca da UFPR diariamente. E, num livro sobre fisiologia clínica, Adolfo encontrou referências à doença de Tay-Sachs - muito parecida com a gangliosidose, o que o fez entender o mal que acometia seu filho. "Entendi o mecanismo de ação. Mas e daí? O que fazer com aquilo?"

Creme de sorvete. A partir disso, Adolfo percebeu que a doença tinha relação com a enzima beta-galactosidase, que era produzida pelo corpo de Vitor de maneira deficiente.

Ele passou a ler livros sobre enzimologia. E descobriu que essa enzima foi utilizada na fabricação de cremes para sorvetes na década de 1950, mas teria caído em desuso porque surgiram os cremes sintéticos.

Ele precisava dessa matéria-prima para pensar num possível medicamento. Disparou e-mails para dezenas de laboratórios do mundo todo que chegaram a produzir essa enzima no passado. Escreveu para Japão, Canadá, EUA, México, Índia, Espanha. Expôs seu caso para vários médicos, mas não conseguia apoio de nenhum deles para a ideia, que parecia maluca. "Ninguém me dava atenção. Diziam que era loucura minha", relembra.

Os meses passaram, e a sorte se voltou para Adolfo. A pediatra de Vitor ligou para ele, dizendo que o pai de um paciente era funcionário de um laboratório e iria ajudá-lo a conseguir a enzima. "Passei um fax com a ficha técnica. Pouco tempo depois, a matriz me enviou uma amostra de 50 ml da enzima."

Uma gota. Com a matéria-prima em mãos, Adolfo foi a uma farmácia de homeopatia, que com uma única gota da enzima desenvolveu uma matriz e um "medicamento" para ser tomado diariamente pelo menino. "Ainda assim, os médicos eram contra. Diziam que eu ia matar meu filho."

O medo de efeitos colaterais mais sérios fez Adolfo tomar o produto várias vezes antes de oferecer a Vitor. "Fui a cobaia." O menino começou, então, a tomar as gotas e, quase como num milagre, a doença deixou de progredir de forma tão agressiva.

Vitor parou de andar aos 15 anos. Hoje, caminha quando é escorado pelos braços do pai. Ele não fala, mas é capaz de conversar com o pai por meio de gestos e sons. "Ele entende e leva as pessoas a entenderem o que quer." Na escola, reaprendeu coisas básicas, como tirar e colocar os sapatos e escovar os dentes.

Nesse período, Adolfo quase perdeu a casa - ele deixou de pagar as prestações porque gastou o dinheiro no tratamento de Vitor - e ficou sem carro. Não voltou a trabalhar e vive em função do filho, com ajuda de doações. Adaptou a cadeira de rodas de Vitor à sua moto: é assim que o leva à escola, à terapia, aos médicos.

A evolução inesperada do jovem fez com que outras famílias procurassem Adolfo em busca do "medicamento" que ele tinha descoberto, mesmo sem comprovação científica. "Até hoje, ninguém conseguiu rebater minha teoria sobre a eficácia do produto. Fiz pelo Vitor o que qualquer pai faria."